Ganchinhos

" É assim, a Lucile tava dizendo, uma pessoa vem e enfia esses anzóis dentro de ti, mas bem devagarinho pra não doer. E não dói mesmo, é até gostoso na hora, porque ela põe um de cada vez, e os anzóis são bem fininhos, e ela faz um carinho e te dá um beijo entre um anzol e outro, e tu nem notas, mas quando vês, tás com um monte deles enfiado no peito, bem fundo. Eles se prendem lá e não tem como tirar, sabe como são os anzóis, as pontas são finas como agulhas e vão crescendo aos poucos e de repente afinam de novo, então não tem como tirar sem arrancar junto uns pedaços teus, do teu peito, e do coração, porque é claro que ela é tão jeitosa e tão paciente que vai conseguir meter uns deles no teu coração e tu nem vais perceber. Não dá pra tirar sem que doa um monte, e tu acabas preferindo morrer a arrancar tudo aquilo da tua carne de uma vez só. Tirar aos poucos é difícil, leva muitos dias pra conseguir desprender um deles, e mesmo assim dói um pouquinho, é incômodo, e se te afobas, sangra. E tem correntinhas presas atrás dos anzóis, saindo da tua pele e levando até a dona deles, e se tu te afastas muito essas correntes se esticam e arrancam uns dos ganchinhos dali, daí dá aquela dor horrível que te faz chorar de joelhos feito uma retardada e rezar pra ela não se afastar mais, e tu ficas cheia de furos. A verdade é que quanto menos mexer naquilo, melhor.

“É uma definição estranha de amor, Lucile,” a Vanessa disse e riu um pouco. Tava olhando pra Lucile, gostando de olhar pra ela, e as duas tavam sozinhas no que ia ser a parte de trás do bar da Vanessa.

“Mas é verdade. E vêm outras pessoas e te metem outros ganchinhos, nos espaços que ainda tão sobrando, até que chega uma hora em que não tem mais espaço pra ninguém, ou em que o teu peito tá tão esburacado que tu já ficas com medo da dor e não queres nunca mais saber de ganchinhos.”


(Lesbian Pulp - Elfman)

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